sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Entrevista com TEREZA RODRIGUES VIEIRA sobre uso de banheiros em estabelecimentos abertos ao público por transexuais. Advogada especialista em mudança de nome e sexo, professora universitária, PhD em Direito pela Université de Montreal (Canadá), com diversas obras publicadas sobre o assunto. 11 99995-4364 terezavieira@uol.com.br

1.    Existe lei sobre transexualidade no Brasil?
R.Infelizmente, ainda não temos lei específica, em nível nacional, que aborde o assunto de forma explícita. Para o uso do nome social, há portarias, decretos etc que o autorizam em estabelecimentos de ensino, de saúde etc. Existem alguns projetos de lei, mas nenhum na iminência de ser aprovado neste momento. Este assunto não traz votos, pelo contrário, bancadas religiosas o rejeitam veementemente. As pessoas transexuais e travestis também encontram problemas de uso do banheiro de acordo com o gênero, no trabalho e nas escolas. Está em discussão o anteprojeto de lei do Estatuto da Diversidade Sexual, do qual integrei a primeira comissão nomeada pela OAB para a sua elaboração, no qual há um artigo específico que determina que em todos os espaços públicos e abertos ao público é assegurado o uso das dependências e instalações correspondentes à identidade de gênero. A advogada gaúcha Maria Berenice Dias coordena a equipe e comanda  nacionalmente a coleta de mais de um milhão de assinaturas para aprovação do Estatuto. http://www.peticaopublica.com.br/pview.aspx?pi=EDS
2.    Há estados que regulamentam o uso de banheiro públicos?
R Há cidades em que a Câmara de Vereadores aprovou lei proibindo o uso de banheiro público por travestis. O Estado de São Paulo enfrentou a situação, em decorrência de alguns casos semelhantes terem ocorrido em shoppings da capital. O transexual é quem deve escolher qual banheiro deseja utilizar. Ademais, existem penalidades para os infratores da Lei 10.948, de 2001, que pune a discriminação contra transgêneros, inclusive, proibindo o ingresso ou permanência em qualquer ambiente ou estabelecimento público ou aberto ao público. A vítima LGBT poderá, inclusive, pedir indenização por dano moral.
3.    O que podem os transexuais ou travestis fazerem nesta situação?
R A nosso ver, os transexuais devem usar o banheiro de acordo com o gênero com o qual se identificam e se sentem pertencer. Os estabelecimentos devem treinar os funcionários para aprenderem a  respeitar a diversidade. Discriminar ou agir preconceituosamente contra  o público LGBT  demonstra intolerância à liberdade e exercício da cidadania. Quem se sentir ofendido pode imediatamente procurar a administração do estabelecimento, Defensoria Pública (disque 181), Secretaria de Direitos Humanos, Secretaria da Justiça e da Cidadania, Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (DECRADI). Pode usar o Disque 100 ou envio de mensagem para o disquedenuncia@sdh.gov.br, por tratar-se de uma violência aos direitos humanos. Assim, os transgêneros podem apresentar sua denúncia pessoalmente ou por carta, internet ao órgão competente estadual ou ONG de defesa da cidadania e direitos humanos. Os estabelecimentos poderão receber advertência, multa ou terem suas licenças de funcionamento cassadas. A vítima, poderá, inclusive, acionar juridicamente o estabelecimento para eventual responsabilização civil, com indenização por dano moral. 
Sou contrária a criação de banheiros exclusivos para o público LGBT, o que é ofensivo, discriminatório e afronta  o direito à diversidade sexual. Homossexualidade e transexualidade não são doenças. Nossa sociedade é plural e o respeito à diversidade promove o exercício da cidadania.
4.    Que direitos são afrontados com a proibição do uso do banheiro feminino por transexuais?
R Infringe sua dignidade enquanto pessoa humana, protegida pela Constituição Federal, além do princípio da igualdade. Transexuais e travestis têm os mesmos direitos assegurados  aos demais cidadãos. O uso do banheiro deve ser garantido a todos de acordo com o gênero a que sente pertencer. Fazer uso de banheiro diverso incompatível com sua identidade de gênero é discriminatório  e infringe a autodeterminação.
Nenhuma norma pública ou interna poderá desrespeitar o livre exercício da identidade de gênero ou da orientação sexual das pessoas. As normas existentes devem ser interpretadas sempre em favor da não discriminação.
5.    Todos os transexuais sofrem preconceito?

 R Independentemente do número de transexuais que exista, entendemos que não há um único que não tenha sofrido algum tipo de discriminação ou preconceito uma vez na vida, pelo menos, em decorrência da sua identidade de gênero discrepante com seu sexo biológico de nascimento. Sucede que, nem todos denunciavam. Hoje em dia existem mais canais para as denúncias. Sou a favor da criminalização da homofobia e da transfobia. As pessoas passaram a respeitar mais o negro depois que a discriminação racial passou a ser crime inafiançável. O mesmo deveria ocorrer quanto à discriminação aos LGBTs.

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